quinta-feira, novembro 27, 2008

Um banquinho, uma visão



Foi deitado num banco velho que vi tudo isso. Debaixo de uma árvore com uma relva que cobria todo o chão. Nem tive muito ânimo para observar os prédios antigos a minha volta. Fechei os olhos e apenas senti um cheiro agradável das flores e deixei meus ouvidos abertos para ouvir aquele barulhinho bom: pássaros, vento, cachorros que latem...


Com aquela camisa xadrez sobre meu rosto, deixei meu corpo entregue ao conforto daquele espaço. Mesmo cansado, nem dormi, apenas pensei. E percebi o quanto Deus me ama, o quanto isso é suficiente para mim. A expressão perfeita deste amor é deveras visível, seja nas relações com os amigos ou até mesmo no encontro pessoal com esse Deus através do Espírito Santo.


É, não tenho tempo mais para lamentar aquilo que não vivi ou reclamar daquilo que me incomoda. Enquanto eu descansava naquele lugar belo, muitos sofrem sem poder olhar para natureza e perceber que até ela clama pela redenção. Qualquer murmuração se torna mesquinha em meio a um mundo perdido, imerso na incerteza e no desamor.


Não dá continuar a correr tão forte atrás do vento. O mundo clama por nós. Os desabrigados que se irritam com a chuva, os deprimidos que não dormem nem descansam, as vítimas de abuso sexual, os amigos que choram por companhia, os alcoolistas mal amados e os milhares marginalizados pelo sistema opressor comandado pelo príncipe deste mundo.


Preocupar-me demasiadamente com a prova de amanhã sem ter sensibilidade com aquele que sofre é patético. Ou revemos nossas prioridades ou nos entregaremos à mediocridade que conserva a podridão, corrói a alma e detona a esperança. Que a nossa voz se misture com a da natureza num coro em uníssono: Maranata, ora vem Senhor Jesus!


quinta-feira, novembro 20, 2008

Suas palavras são densas. Desde as primeiras frases me perco. Tento voltar o raciocínio e me embaraço novamente. Na eminência de desistir, um enunciado chama minha atenção. Animado, avanço no entendimento. Sim, são palavras de vida! Trazem esperança, mas desnudam meu interior. Me animam sem me tirar aquele incômodo que me espreme na parede e diz: quem você realmente é?

Ao pensar na pergunta, me desiquilibro novamente. Perco o fio da meada. Volto a olhar a imensidão de suas palavras e só vejo um todo que é denso, imenso. Meu olhar limitado capta mais um fragmento do seu discurso. Aquilo que senti no momento anterior me ajudou a ver melhor. São palavras de morte! Evocam o luto esquecido e o choro escondido na multidão das minhas ocupações vãs.

Minha mente está ainda em ressonância. Os sons vibram em velocidade constante. O efeito traz múltiplas sensações: um pouco de alegria, vergonha, medo, decepção, coragem... tudo isso ao badalar de uma música que atrai essas notas ao lugar mais profundo de mim.

Até que você pára de falar. As luzes apagam mas ainda vejo o espectro do seu rosto. Que olhar sombrio! Não bastava falar? Tem que externalizar isso em expressões que refletem meu estado mórbido de ser? Sim, sua aparência era semelhante a um espelho sem cor. Diante do turbilhão de imagens, sons, sentimentos, senti-me diferente. Nem bom, nem ruim, apenas estranho. Senti falta de um abraço.

quinta-feira, novembro 13, 2008

Faz parte de mim


Faz parte de mim. As preposições que se polarizam no interior fazem parte. E aquela dialética sem síntese toma conta de tudo, inclusive de mim. De um lado o eu, e de outro, o não-eu. O conflito de ser, não-ser ou ser-outro prossegue. O alívio vem na luta, no suor, nas gotas de sangue. "Pai, afasta de mim esse cálice"! Ufa! Dizer isso refrigera, mesmo consciente de que terei que tomar o que você esteve pronto para beber.

Não me importo. O sabor do fel com vinagre não substitui a glória de saber que você está por perto. Assim, aquele gosto amargo se adocica no mesmo momento que me contorço ao degustar esse ferrugem amalgamado em minha boca. Cuspo. Bebo água. A doçura vem em minha mente, mas minha boca continua cheia desse gosto horrendo: faz parte de mim.
Surge uma voz que diz: "Vem". Confuso, pergunto: "Seria comigo mesmo"?

Faz parte de mim.

Não há mais tempo. É hora de ir, assim, desse jeito mesmo. Vou, com esse gosto amargo, com o delírio imaginativo da doçura, assim mesmo, pois faz parte de mim.

sábado, novembro 08, 2008

Poesia interna

Desde semana passada venho na tentativa de escrever algum poema. Todas minhas elaborações se frustraram diante tanta feiura que encontrava em minhas palavras. Pensei que o sofrimento poderia me inspirar. Sofri, mas nada veio. Achei que a alegria me iluminaria. Balela: sorriso algum constrangeu minh'alma a expressar a beleza lírica dos sentimentos que me cercam. Recorri aos meus inspiradores por excelência. Nem Cecília Meireles, nem Vinícius de Moraes... nem mesmo meus amigos poetas! Ambos falharam no meu processo inspirador. Busquei no amor latente que me envolve, solve, move... nem este me elevou à poesia que tanto me incomodava, mas não saía de mim. Resolvi não tentar mais. Afinal, há tempo pra tudo: tempo de sentir, tempo de transformar lágrimas em versos e alegria em poesia. Enquanto isso não ocorre, continuo a sentir - este é meu tempo. Vou poetizar com o que sou, sem caneta, nem papel, mas com um lirismo interior, da alma.

segunda-feira, novembro 03, 2008

O mundo de ponta-cabeça

Aprendi a andar com as mãos

Vejo tudo do outro lado

Enxergo tudo pelas metades

Ao tentar olhar pra frente, o pescoço dói

Perdi minhas esperanças no contrário

Pois o normal é o mundo ponta-cabeça

Se não consigo me desvirar, porque tudo não se vira?

Dizem que o pior é não tentar.

Minha lamentação nem é essa.

Passei dessa fase.

O pior é conseguir.

Pois nem sempre se conquista o que quer.

Quem me convencerá que isso é o melhor?

Continuo vendo tudo trocado.


(Achei esse texto perdido entre minhas coisas. Não me lembro da ocasião em que escrevi.)