domingo, junho 08, 2008

A "velha" e o mocinho

Na última sexta-feira me aventurei a ir ao banco. No meio à demora da fila, gastei um tempo emitindo sons pela boca e batucando sobre minha pernas. Com receio que o barulho incomodasse os "pacientes", fui obrigado a arrumar outro entretenimento. Pensei em refletir sobre o cotidiano daqueles heróis que esperavam pela glória do fim.


Enquanto eu procurava o alívio que poderia compensar o tempo perdido naquele local, comecei a ouvir gritos agudos e fortes. Percebi logo que era uma criança. Por isso me animei. Crianças sempre nos trazem alegria. O menininho tinha mais ou menos 2 anos. Aliás, acho que menos. Ele não falava muitas palavras. Era loirinho e tinha olhos azuis.

Com ele, estavam sua mãe e seu irmão, que deveria ter 8 anos. Este era bem magro e tinha um boné rosa, bem rosa! Sua mãe parecia velha, deveria ter mais de 40. A brincadeira do menino era muito engraçada: ele pegava o boné do irmão, jogava ao chão e gritava: pega! Dai, o irmão ia lá, pegava o boné e colocava na cabeça. Porém, o garoto começava a gritar, e enfim, o irmão devolvia o boné ao seu irmãozinho. E o ciclo recomeçava!

Contudo, o ciclo era criativo: o menino começou a jogar o boné para outras direções. Chegou até a interagir com os outros "esperantes". Mas a mãe tentava interromper o ciclo. Aliás, ela fazia um jogo com ele. Deixava e ao mesmo tempo queria impedir que o menino se expressasse muito. Só que o garotinho era guerreiro: desafiou o tédio com alegria, choro e gritos.

Até que o momento mais esperado chega: a mãe é atendida. Talvez o garotinho não soubesse que esse atendimento poderia significar a benção da saída daquele espaço democratizador do tédio. Para segurar o menino, a mãe coloca o irmão mais velho para cuidar dele. Mas parecia que o irmão também estava tão alheio ao ambiente que deixou o menino ir um pouco além, perto dos atendentes. O pequeno ficou admirado com os computadores, mesas, impressoras, calculadoras, enfim, percebeu atentamente os detalhes do espaço.

E ai, infelizmente, vem a mãe e pega o menino no colo. Entre o choro e tentativas de sair dos braços da mãe, o garoto se rende. O tédio não venceu, não, não venceu. Foi apenas uma trégua resistente, mas trégua. A escolha foi pelos braços da mãe, tenho certeza.

Após o atendimento, a família se vai. E eu, fiquei, esperando por outro momento transcendente.

6 comentários:

Bárbara Matias disse...

Acho tão interessante e mágico o fato de observarmos uma simples cena do cotidiano e isso nos levar a uma reflexão profunda e que faz sentido pra nós. E a gente "viaja" mesmo (rs).... mergulha nas nossas idéias e no observar...

Gostei desse retrato de algo comum e da idéia da "trégua", da criatividade resistente.

Bjs

Edmar Hell Kampke - Mazinho disse...

Parecia que vc tava bem aborrecido de estar lá na fila!

Filipe Garcia disse...

E aí Gustavo.

Gostei do estilo da sua escrita e da forma como expõe os acontecimentos.

Um abraço.

Alberto Vieira disse...

Gostei da sensibilidade de enxergar essa cena. Tantas como essas ocorrem no nosso dia e dia e é dificil enxerga-las.

abraços

lucas rolim disse...

Vou roubar o q foi dito pela bárbara:
Gostei desse retrato...
Ja disse e repito: Gosto muito da sua escrita.

Ah! e obrigado por me perdoar hehehehehe

Abraços

Renato Luiz disse...

Foi pro coração!